quarta-feira, 4 de dezembro de 2013

Gabriel M. Faria 

14 de novembro de 2013

No táxi, a caminho da aldeia, o motorista sequer sabia que os índios continuavam ali, assim como muita gente com a qual conversei antes das visitas.
Foi a primeira vez que vi a aldeia sem os muros e toda aquela mata que havia dentro, foi automático ver aquele " intruso"  - numa paisagem tão acéptica como a dos arredores do novo maracanã - e tentar calcular quanto tempo eles ainda teriam ali até que o Estado "limpasse" a área.  
A todo momento me pegava tentando imaginar que tipo de ligação poderia ser tão forte para que eles quisessem tanto aquele prédio em ruínas, pois a minha interpretação sempre foi a de que museu não é e nem nunca será um lugar que abrigue qualquer tipo de cultura, para mim museu é exposição, e somente, e no caso do museu do índio, até onde eu sabia, não era diferente, e foi depois do abandono e a consequente desativação que aquelas pessoas passaram a viver ali, mas eu sei mesmo de muito pouco sobre o caso, então tentei deixar a mente aberta.
Bia fazia fotos, quis saber o que ela achava que deveria ser a questão central, e quanto mais conversávamos mais nos perdíamos, foi a minha impressão. Desde o início deixei claro para Nathanael e Filipe que a questão, para mim, não estava esclarecida, e a outra dúvida que nos consumia era: como não fazer um documentário?
Quando entrei no prédio havia uma fogueira entre duas fileiras de bancos, ao fundo uma mesa com quem me pareciam ser os líderes. Um homem e duas mulheres.
Discutiam muito sobre os índios "vendidos" que aceitaram as propostas do governo, insistiam que não sairíam dali, e frequentemente os convidados brancos discutiam a questão da resistência, relembrando atos heróicos da aldeia, e defendendo a permanência dos mesmos.
Me chamou a atenção as constantes discussões sobre identidade indígena dentro da aldeia, e principalmente os jovens classe média ali dentro. Tentei expulsar os preconceitos, mas ao ver um conhecido meu, que já trabalhou comigo, ex-aluno de filosofia da ufrj, sem camisa, pintado como índio e repetindo (às vezes convocando) os gritos índigenas entre uma fala e outras mais contundente, eu desisti de vencer meu preconceito. Achei de uma idiotice profunda, ainda mais depois de entrar em contato com essa pessoa e ela sequer ter noção das atividades que seriam feitas durante a semana na aldeia.
Mas em geral o fato dos não-indígenas estarem ali não me afetava, tanto que ao conhecer Francis não estranhei: é um negro, vindo de quilombos de Minas e Espírito Santo para a Aldeia Maracanã. Me pareceu muito verdadeira a sua relação com tudo ali, e se coubesse a mim esta afirmação eu diria que dentre os indígenas ali presente, Francis com toda certeza era um deles.
Sem uma questão definida para averiguar resolvi observar tudo, e continuava sem entender o que motivava tanto um grupo indígena de várias etnias a se manter dentro de uma cidade como o Rio de Janeiro (ou qualquer outra grande cidade), já que pra mim eram culturas baseadas em suas relações com a natureza.
O cheiro do lugar, que tanto incomodou alguns membros da equipe, não me causou qualquer sensação de estranhamento, Francis tinha um cheiro forte, mas isso tampouco me incomodava.
Não conversamos com ninguém, mas ficamos sabendo, por intermédio de Francis, sempre muito atencioso conosco, que haveria um mutirão para a construção das ocas, além de aula de guarani e uma mesa de diálogos com as mulheres da aldeia, tudo isso no sábado, o que nos seria muito útil, tanto para o material filmado quanto para a pesquisa. As questões que eu construí ali para levar ao grupo eram as seguintes: saber de onde ver a subsistência daquele grupo, onde compram suas comidas?, a falta de comida típica era um problema?, as crianças iam ao colégio?, sofriam algum tipo de preconceito, de pais, colegas ou professores? E o que pretendem fazer com o espaço, numa possível reforma do mesmo, no sentido de subsistência?
Houve uma roda para danças e cantos ao final da discussão, e pessoas de todos os meios apareceram e participaram, me chamaram para entrar mas preferi ficar de fora olhando, o que foi uma besteira, deveria ter me juntado.

Saí de lá pensando até onde eles teriam realmente direito àquele lugar, sem julgamentos de certo ou errado, somente tentando ver a situação muito de fora, mas como a neutralidade é impossível eu entendi que não entendia nada, e que não havia feito pesquisas e entrevistas suficientes para ter sequer uma rasa noção sobre o que é aquela luta ali. 

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