8/11
– 1° dia
O
primeiro ângulo da AM avistado foi o lateral: eu, Daniele e Beatriz estávamos
contornando o prédio para entrar. Mayara, que chegara antes e decidiu entrar
com conta própria, relatou que o lugar era “trash”. Preferi não argumentar
muito: deixei que o grupo decidisse o que iria fazer. Entrando no perímetro da
AM, constatei que o prédio tinha vidros e janelas quebradas, e suas paredes
pintadas com diversos escritos e desenhos: ninguém veio nos receber. Mayara
veio nos encontrar fora do prédio: contou sobre umas “cantadas” que levou de
algumas pessoas, além da suposta condição imprópria dos mesmos: ao que parece,
estavam alcoolizados e fumavam maconha. Particularmente, não sentia nenhum
cheiro reconhecível de maconha: tinha algum cheiro estranho, mas não totalmente
desagradável. Daniele e Beatriz hesitaram e eu apenas perguntei: vocês querem
entrar? Mayara e Beatriz assentiram, e a primeiro puxou todos para dentro:
senti-me aliviado e preocupado, me perguntando o que aconteceria a seguir.
Entramos no prédio e ficamos no saguão: pessoas das mais diversas (tinha um
grupo meio classe-média underground também) começaram a chegar e havia até
crianças pequenas. Tivemos sorte: além de uma oficina de pintura (que um índio
começou a explicar), haveria uma palestra sobre a história do local (que outro
índio, graduando de História pela UERJ iria ministrar) e o projeto da UIAM. Não
simpatizei com o primeiro: ele tinha colares, brincos, usava um chapéu, fumava
um cachimbo, mas não me convencia: ele falava demais. O segundo chegou,
trazendo vários alunos e professores da UERJ que sentaram em bancos e se
prepararam para ouvir: nesse eu confiei mais, usava cocar, colar e um ornamento
na cintura: eu queria entrevistá-lo. E ele começou a palestrar: procurei gravar
tudo, mas a bateria da câmera acabou no meio da palestra. Mayara, que tirava
fotos, me deu o gravador. Quando ele terminou, Daniele e Beatriz já haviam ido
embora: ficamos eu e Mayara entrevistando. Primeiro, um anarco-punk que estava
responsável pela oficina de pintura e morava lá fazia alguns meses. Depois,
gravamos e filmamos duas danças (coré, segundo os índios). Procuramos alguém
que nos indicasse quem eram os índios residentes e entrevistamos um homem alto
e gordo: não falou muito, mas pediu que falássemos com um cacique (um senhor
baixinho e simpático que falava espanhol). Seu relato foi longo e muito
interessante: ele era de uma tribo isolada do Acre e contou sobre política,
Funai e as dificuldades atuais da comunidade indígena. Durante a conversa ele
chamou uma moça: ela nos passou vários contatos por Facebook. Ainda outro índio
chegou e conversamos rapidamente com ele: era advogado. O índio da palestra
tinha que voltar para a UERJ, mas nos passou seu celular. O cacique pareceu
gostar muito de nós: pediu para que tirássemos uma foto com ele no fogo (que,
disse ele, é sagrado para os índios). Ele se ornamentou e, enquanto cantava,
posamos para a moça tirar nossa foto. Aí, nos despedimos: já estava anoitecendo
e a luz era precária no prédio.
10/11
– 2° dia
Nesse
dia, fomos apenas eu e Nathanael, chegando a tarde, pela hora do almoço, e
estava havendo um mutirão para pintar a fachada do prédio: as pessoas tinham
participado da oficina de pintura da última visita. Apresentamos-nos a José
Guajajara, cacique do Maranhão, residente da Aldeia, nos orientando a conversar
com um grupo de mulheres que estava em uma oca. Lá, havia 3 mulheres e 2
crianças. Perguntamos se poderíamos filmá-las: eles não aceitaram, mas
aprovaram que gravássemos a conversa por áudio. A mulher que parecia mais
velha, com uma criança, preferiu se retirar. A primeira nos contou sua
história: vinha do Equador, morando em vários locais, até chegar ao Rio, estava
se graduando em Sociologia na UERJ quando conheceu movimentos sociais, como a
Aldeia, trancando sua graduação. A segunda, sua companheira, era de Niterói e
cursou Produção Cultural na UFF, tendo contato com os movimentos desde a
graduação também. Juntas, elas moram na Lapa com a filha pequena: relataram que
antes, eram mais engajadas na Aldeia, chegando a residir, mas que agora estavam
mais como colaboradoras, ainda que amigas. A filha fazia aulas de tupi e canto
na Aldeia. Depois, fomos conversar com José: ele nos levou a parte de trás do
prédio e nos sentamos para ouvi-lo. Ele contou sobre a história do prédio
e do movimento Aldeia Maracanã Resiste: as desapropriações, negociações,
embates com a polícia e a ocupação. Além disso, revelou que a relação política
que existe na Aldeia é apartidária, pois eles enxergam não ser uma via possível
para resolução dos problemas dos povos originários.
16/11
– 3° dia
Novamente,
eu e Nathanael comparecemos a essa visita. Preferimos chegar mais cedo pois
haveria um mutirão para levantar ocas que, até o momento da nossa saída, não
havia ocorrido. Primeiramente, nos apresentamos ao índio Axãnica, que nos
concedeu uma rápida entrevista. Depois, fomos conversar com uma moça e um rapaz
que estavam na oca, e visitavam o local para ajudar: também eles já conheciam
pessoas da Aldeia por visitas anteriores. A moça, Mariana, psicóloga formada na
UERJ, relatou suas motivações para estar ali, que além de política, incluíam
fatores familiares: ela buscava reatar laços com a avó materna, índia do Acre,
que teve seus filhos separados dela a força. O rapaz, Rodolpho, geólogo, socialista
declarado, fez seus relatos, fortemente baseados no posicionamento político.
Nathanael, após isso, ajudou na horta que estava sendo preparada por outros
integrantes da Aldeia. Conversamos, os 4, sobre diversos assuntos, sem gravar,
explicitamente uma ou outra pessoa. Os 2 saíram e retornamos a conversar
com Axãnica, nos fundos do prédio: ele ajudava a preparar o almoço para os
residentes. Enquanto falávamos, um jovem chegou e pareceu ter intimidade com o
índio: cumprimentou-o pelo nome e “celebrou uma medicina”, demonstrando
reverência. Escolhemos chamá-lo para conversar também: após a fala de Axãnica,
ele contou que cursava Filosofia na UFRJ, tendo interesses expressamente
culturais em estar ali. Axãnica contou-nos que várias são as pessoas que circulam
na Aldeia, desde índios, apoiadores e estudantes residentes, envolvendo pessoas
das mais variadas classes, credos e formação: posicionando a Aldeia como espaço
democrático de discussão e de atividades ligadas a cultura indígena. Ele nos
deixou para atender uma chamada ao celular e resolvemos que era hora de ir
embora.
20/11
– 4° dia
Pela
primeira vez, todo o grupo estava reunido para uma visita à Aldeia: em
compensação, devido ao feriado (e ser meio de semana) não havia tantas pessoas
para conversarmos. O primeiro entrevistado foi Paulo Apurinãme, cacique do
Amazonas: como fui o primeiro a entrar, acabamos por conversar um pouco sobre
relacionamentos. Esse assunto guiou a introdução da entrevista, que logo após,
bandeou para política: ele é candidato a senador pelo PSOL-AM. Depois da
conversa, nos reunimos para definir as diretrizes do trabalho. Procurando mais
pessoas, entrevistamos uma menina que lavava louças na parte externa e entramos
no casarão: conversamos com Francis, que nos contou sobre sua experiência em
comunidades quilombolas, além da sua residência na Aldeia: um fato interessante
foi o relato do revezamento que existe para que a Aldeia nunca fique
“desguarnecida”. Ele acabou nos levando ao andar superior do prédio e tivemos
oportunidade de explorar mais o espaço.
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