terça-feira, 3 de dezembro de 2013

Filipe Santos

8/11 – 1° dia
O primeiro ângulo da AM avistado foi o lateral: eu, Daniele e Beatriz estávamos contornando o prédio para entrar. Mayara, que chegara antes e decidiu entrar com conta própria, relatou que o lugar era “trash”. Preferi não argumentar muito: deixei que o grupo decidisse o que iria fazer. Entrando no perímetro da AM, constatei que o prédio tinha vidros e janelas quebradas, e suas paredes pintadas com diversos escritos e desenhos: ninguém veio nos receber. Mayara veio nos encontrar fora do prédio: contou sobre umas “cantadas” que levou de algumas pessoas, além da suposta condição imprópria dos mesmos: ao que parece, estavam alcoolizados e fumavam maconha. Particularmente, não sentia nenhum cheiro reconhecível de maconha: tinha algum cheiro estranho, mas não totalmente desagradável. Daniele e Beatriz hesitaram e eu apenas perguntei: vocês querem entrar? Mayara e Beatriz assentiram, e a primeiro puxou todos para dentro: senti-me aliviado e preocupado, me perguntando o que aconteceria a seguir. Entramos no prédio e ficamos no saguão: pessoas das mais diversas (tinha um grupo meio classe-média underground também) começaram a chegar e havia até crianças pequenas. Tivemos sorte: além de uma oficina de pintura (que um índio começou a explicar), haveria uma palestra sobre a história do local (que outro índio, graduando de História pela UERJ iria ministrar) e o projeto da UIAM. Não simpatizei com o primeiro: ele tinha colares, brincos, usava um chapéu, fumava um cachimbo, mas não me convencia: ele falava demais. O segundo chegou, trazendo vários alunos e professores da UERJ que sentaram em bancos e se prepararam para ouvir: nesse eu confiei mais, usava cocar, colar e um ornamento na cintura: eu queria entrevistá-lo. E ele começou a palestrar: procurei gravar tudo, mas a bateria da câmera acabou no meio da palestra. Mayara, que tirava fotos, me deu o gravador. Quando ele terminou, Daniele e Beatriz já haviam ido embora: ficamos eu e Mayara entrevistando. Primeiro, um anarco-punk que estava responsável pela oficina de pintura e morava lá fazia alguns meses. Depois, gravamos e filmamos duas danças (coré, segundo os índios). Procuramos alguém que nos indicasse quem eram os índios residentes e entrevistamos um homem alto e gordo: não falou muito, mas pediu que falássemos com um cacique (um senhor baixinho e simpático que falava espanhol). Seu relato foi longo e muito interessante: ele era de uma tribo isolada do Acre e contou sobre política, Funai e as dificuldades atuais da comunidade indígena. Durante a conversa ele chamou uma moça: ela nos passou vários contatos por Facebook. Ainda outro índio chegou e conversamos rapidamente com ele: era advogado. O índio da palestra tinha que voltar para a UERJ, mas nos passou seu celular. O cacique pareceu gostar muito de nós: pediu para que tirássemos uma foto com ele no fogo (que, disse ele, é sagrado para os índios). Ele se ornamentou e, enquanto cantava, posamos para a moça tirar nossa foto. Aí, nos despedimos: já estava anoitecendo e a luz era precária no prédio.

10/11 – 2° dia
Nesse dia, fomos apenas eu e Nathanael, chegando a tarde, pela hora do almoço, e estava havendo um mutirão para pintar a fachada do prédio: as pessoas tinham participado da oficina de pintura da última visita. Apresentamos-nos a José Guajajara, cacique do Maranhão, residente da Aldeia, nos orientando a conversar com um grupo de mulheres que estava em uma oca. Lá, havia 3 mulheres e 2 crianças. Perguntamos se poderíamos filmá-las: eles não aceitaram, mas aprovaram que gravássemos a conversa por áudio. A mulher que parecia mais velha, com uma criança, preferiu se retirar. A primeira nos contou sua história: vinha do Equador, morando em vários locais, até chegar ao Rio, estava se graduando em Sociologia na UERJ quando conheceu movimentos sociais, como a Aldeia, trancando sua graduação. A segunda, sua companheira, era de Niterói e cursou Produção Cultural na UFF, tendo contato com os movimentos desde a graduação também. Juntas, elas moram na Lapa com a filha pequena: relataram que antes, eram mais engajadas na Aldeia, chegando a residir, mas que agora estavam mais como colaboradoras, ainda que amigas. A filha fazia aulas de tupi e canto na Aldeia. Depois, fomos conversar com José: ele nos levou a parte de trás do prédio e nos sentamos para ouvi-lo.  Ele contou sobre a história do prédio e do movimento Aldeia Maracanã Resiste: as desapropriações, negociações, embates com a polícia e a ocupação. Além disso, revelou que a relação política que existe na Aldeia é apartidária, pois eles enxergam não ser uma via possível para resolução dos problemas dos povos originários.

16/11 – 3° dia
Novamente, eu e Nathanael comparecemos a essa visita. Preferimos chegar mais cedo pois haveria um mutirão para levantar ocas que, até o momento da nossa saída, não havia ocorrido. Primeiramente, nos apresentamos ao índio Axãnica, que nos concedeu uma rápida entrevista. Depois, fomos conversar com uma moça e um rapaz que estavam na oca, e visitavam o local para ajudar: também eles já conheciam pessoas da Aldeia por visitas anteriores. A moça, Mariana, psicóloga formada na UERJ, relatou suas motivações para estar ali, que além de política, incluíam fatores familiares: ela buscava reatar laços com a avó materna, índia do Acre, que teve seus filhos separados dela a força. O rapaz, Rodolpho, geólogo, socialista declarado, fez seus relatos, fortemente baseados no posicionamento político. Nathanael, após isso, ajudou na horta que estava sendo preparada por outros integrantes da Aldeia. Conversamos, os 4, sobre diversos assuntos, sem gravar, explicitamente uma ou outra pessoa.  Os 2 saíram e retornamos a conversar com Axãnica, nos fundos do prédio: ele ajudava a preparar o almoço para os residentes. Enquanto falávamos, um jovem chegou e pareceu ter intimidade com o índio: cumprimentou-o pelo nome e “celebrou uma medicina”, demonstrando reverência. Escolhemos chamá-lo para conversar também: após a fala de Axãnica, ele contou que cursava Filosofia na UFRJ, tendo interesses expressamente culturais em estar ali. Axãnica contou-nos que várias são as pessoas que circulam na Aldeia, desde índios, apoiadores e estudantes residentes, envolvendo pessoas das mais variadas classes, credos e formação: posicionando a Aldeia como espaço democrático de discussão e de atividades ligadas a cultura indígena. Ele nos deixou para atender uma chamada ao celular e resolvemos que era hora de ir embora.

20/11 – 4° dia

Pela primeira vez, todo o grupo estava reunido para uma visita à Aldeia: em compensação, devido ao feriado (e ser meio de semana) não havia tantas pessoas para conversarmos. O primeiro entrevistado foi Paulo Apurinãme, cacique do Amazonas: como fui o primeiro a entrar, acabamos por conversar um pouco sobre relacionamentos. Esse assunto guiou a introdução da entrevista, que logo após, bandeou para política: ele é candidato a senador pelo PSOL-AM. Depois da conversa, nos reunimos para definir as diretrizes do trabalho. Procurando mais pessoas, entrevistamos uma menina que lavava louças na parte externa e entramos no casarão: conversamos com Francis, que nos contou sobre sua experiência em comunidades quilombolas, além da sua residência na Aldeia: um fato interessante foi o relato do revezamento que existe para que a Aldeia nunca fique “desguarnecida”. Ele acabou nos levando ao andar superior do prédio e tivemos oportunidade de explorar mais o espaço.

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